quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Por que stand-up comedy?



Quase todo mundo já sabe, mas não custa explicar pros desavisados: stand-up comedy, ou comédia em pé, é um gênero humorístico que consiste em um comediante "de cara limpa" (sem fantasias ou maquiagem), num cenário neutro, apresentando um texto de sua própria autoria, sem piadas populares, fazendo humor a partir de sua observação do cotidiano.

Impulsionado pela internet (Youtube) e pela TV (CQC, Programa do Jô, Faustão, Altas Horas), o stand-up comedy explodiu no Brasil. Consagrados como Rafinha Bastos e Danilo Gentilli rodam o país em shows-solo (que, pela natureza da proposta, são de fácil produção). Outros nem tão famosos vão ampliando seu espaço. Novatos se lançam na aventura, geralmente integrando grupos que se apresentam em bares. Gente de teatro, já acostumada com o palco, passa a investir no stand-up. E muitos - muitos! - publicitários agora atacam como humoristas.

Bom, eu sou publicitário e também fui seduzido pelo stand-up. Na verdade, acho que ele já vem me chamando há tempos, mas só agora resolvi acreditar. No longínquo 1993, fui escolhido pela turma da faculdade para ser o orador na formatura - é um tipo de stand-up, né?, até porque todo mundo esperava um texto cômico. Refutei, por timidez. Em 2002, na formatura da pós, mesma coisa, mas naquela ocasião acabei topando. E com minha banda, The Jingles, fui aos poucos descobrindo que eu seria muito mais útil (e divertido) falando textos entre as músicas do que tocando ou cantando. E assim, testando-me, flertando com o gênero, criei coragem para a coisa.

Não é fácil. Além de vencer a timidez, é preciso ter boa memória, timing (aquele ritmo adequado para dar o texto), expressão corporal, boa colocação da voz... Além, óbvio, de criatividade e senso de humor para produzir bons textos permanentemente - os grupos que se apresentam em bares costumam prometer textos novos a cada mês, de modo a atrair quem já assistiu a alguma apresentação.

Minha história efetiva como comediante stand-up começou há pouco, em novembro de 2009. Até o momento, fiz quatro apresentações - 3 com o grupo Liga da Comédia e uma com o grupo Queijo, Comédia e Cachaça. E não posso deixar de registrar que o resultado tem sido muito satisfatório. Muito! Bons elogios de outros comediantes, ótimo retorno do público, cumprimentos sinceros ao final... Aproveito para agradecer o apoio de todos nesse início de caminhada, e em especial da minha esposa Ilke pela força incondicional.

Um dos aprendizados mais importantes que trago até agora, a partir do que vivenciei e da observação de outros humoristas, é o desapego que precisamos ter com nosso texto. Nem tudo que a gente pensa que é engraçado funciona, e aquilo que te parecia hilário pode provocar no máximo risinhos discretos. É muito difícil julgar a própria criação - como um pai "babando" no filho recém-nascido, a tendência é acharmos que nossa ideia é a mais linda do mundo. É difícil julgar, mas é fundamental. Se há dúvidas quanto a uma piada, mostrar pra alguém ajuda - mas tem que ser alguém com senso crítico suficiente para perceber problemas e próximo o suficiente para apontá-los. E por fim, se a piada passa por seu crivo e de pessoas próximas mas é mal recebida no palco, o lance é abortá-la, sem dó. OK, às vezes o problema é com o público - resistente, mal humorado, pouco receptivo. Mas só às vezes. Na dúvida, teste a piada em mais uma ocasião. Se não funcionar, esqueça e bola pra frente. Até porque se o comediante tem dificuldade de se desvencilhar daquilo, pode ser sinal de que não consegue criar tantas gags quanto a carreira pede.

O mesmo desapego deve ser exercitado na situação oposta - aquela piada que deu supercerto. Como dito, a expectativa quanto a textos novos não nos deixa acomodar com o sucesso daquilo que foi testado e aprovado. É preciso saber correr o risco de apresentar coisas novas, mas desde que com o olhar atento quanto ao retorno do público. Texto que se repete durante meses só é aceitável em apresentações-solo - ou no teatro.

Fica a dica para os grupos de stand-up. Tenho a sensação de que há pouca troca de impressões entre os comediantes quanto a questões dessa ordem - toques do tipo "fulano, essa piada não está funcionando", "tem um ano que você fala sobre isso" ou ainda "você está falando muito alto" ou "muito rápido". Se esse feedback vem dos colegas, que afinal também são do ramo e estão tão interessados quanto você em sua evolução, o crescimento do grupo como um todo tende a ser mais rápido. Transparência e sinceridade já!

No mais, lá vou eu para a comédia, sem saber bem onde isso vai dar. Mas com muita vontade de fazer bem feito, com originalidade e ética. Tô na área...